voltar - back - retour  


CHÃO SOBRAL – Livro com a dimensão de um povo

- A. VENTURA -

 

Pode dizer-se, em abono da verdade, que a sessão de apresentação do livro de José Ramiro "Histórias, Lendas e Contos do Meu Chão", ocorrida no passado dia 17, na Casa da Cultura de Oliveira do Hospital, teve a dimensão de todo um povo.

De facto, no universo da freguesia de Aldeia das Dez, a comunidade de Chão Sobral tem uma vivência muito própria que a individualiza e que se traduz em diversas manifestações de carácter social e artístico.

E foi toda essa comunidade que se deslocou a Oliveira do Hospital, acompanhando o conterrâneo José Ramiro, um homem que nestas paragens "comeu o pão que diabo amassou e os demónios colocaram no forno", mas que mesmo assim ficou agarrado ao seu "Chão" como real "pátria menor" e que tendo tido o engenho de dar outro futuro aos seus, apurou também a arte de passar para o papel (em verso) a sua vivência envolta numa perspectiva colectiva.

Foi este momento literário enriquecido por uma exposição alusiva ao passado de Chão Sobral, e pela actuação do Grupo de Cantares Tradicionais "Cotovias" do Alvôco de Várzeas, agrupamento que quis testemunhar as ligações geográficas e afectivas entre as duas localidades.

Esta ligação foi ainda reforçada por um outro gesto telúrico, protagonizado pelo dr. Francisco Antunes que ao fazer a apresentação da Obra frisou, efectivamente, o sentimento de amizade que o liga a Chão Sobral, por intermédio dos seus ancestrais de Alvôco de Várzeas.

A presidente da Junta de Freguesia de Aldeia das Dez, Paula Frade, não escondeu o seu orgulho por partilhar com José Ramiro um momento importante na sua vida, que o é também para a comunidade de Chão Sobral, pelo que representa em termos de memória e solidariedade.

Na apresentação que fez de "Histórias, Lendas e Contos do Meu Chão" o dr. Francisco Antunes não teve qualquer rebuço em trazer para a mesa o exemplo do célebre poeta algarvio António Aleixo, evidenciando o modo como José Ramiro soube construir uma monografia em verso, explanação que fez com informações pedagógicas sobre os temas glosados pelo autor.

Com justificável comoção o autor fez uma referência ao modo como a amizade era interpretada (e executada) em Chão Sobral, agradecendo a quem proporcionou a edição do livro, especialmente à presidente da Junta de Freguesia, propondo mesmo que ela fosse considerada "cidadã" da localidade, o que foi "ratificado" com uma salva de palmas pela assistência que enchia o auditório da Casa da Cultura.

Por sua vez, o presidente da Câmara, Professor Mário Alves, aproveitou para uma vez mais explicar a filosofia de acção do município no tocante ao apoio concedido a quem tem talento, sublinhando a sensibilidade de um autor que se não fosse assim não teria possibilidade de fazer ouvir o amor pelo seu "Chão". Lançou mesmo um desafio às pessoas que tenham matéria para publicar que não desistam e mantenham a esperança, pois a sua vez também há-de chegar.

O ritmo, musicalidade e vibratilidade contidos nos versos de José Ramiro foram devidamente sonorizados pela voz de José Vieira.

Do livro agora apresentado pode dizer-se que os poemas nele contidos estão ligados a momentos vividos por José Ramiro, ou que deles teve conhecimento, muitas vezes pela tradição oral, pelo que cada um tem a sua própria "estória", com algumas a entroncarem no foro da intimidade passional forma comprovativa da autenticidade posta na obra.

Como ele próprio refere, na sua vida de Guarda Florestal, conviveu com Miguel Torga que, por sinal, um dia assinou um poema, intitulado, exactamente, "O Poeta" e que parece ter como destinatário José Ramiro:

"Murcha-lhe nos pés o rosmaninho

E a própria rosa, de o sentir, descora;

Mas é um Deus que passeia o seu caminho

A beber a amargura de quem chora".

 

A. VENTURA

in “A COMARCA DE ARGANIL” – 22 de Setembro de 2005

 

 

 

   voltar - back - retour